A coisa mais gostosa que existe na vida é você sentir-se amada, desejada. E minha mãe sempre me fez sentir assim.
Ela me conta que meu nome por exemplo ela estava andando na rua, indo para o trabalho, aos seus 14 ou 15 anos quando viu uma moça brincando com uma garotinha na rua. Essa menina fazia gracinhas pra mãe e a mãe dizia: "-Para Márcinha, vem cá Márcinha." E minha mãe olhando essa cena ficou apaixonada pelo nome e pensou:"-Quando eu tiver uma filha vou colocar esse nome. Márcia." Hunhun, minha mãe me desejou ter quando ainda tinha 14 ou 15 anos. Eu fico muito prosa quando ouso essa história, pois sei que ela sempre me quis. E eu vim, e vim do geitinho que ela pediu.
Minha mãe sempre foi prosa comigo, porque eu sempre fui sabida, desinibida, falante, inteligente até demais, e a minha maior característica: A Alegria. Eu sempre fui uma criança alegre.
Mas voltando um pouco no tempo, eu tive o prazer e a sorte de nascer de um casal que se amava e se respeitava, profundamente. E para meu pai, a primeira gravidez da minha mãe tinha que ser um menino mesmo, mas para não contraria-la ele também dizia que queria uma menina, e tudo de mais cheiroso e mais gostoso, estava na gaveta da Márcinha. Mas nasceu um menino, que eles ainda nem tinham pensado em um nome, e depois se decidiram em por Luiz Cláudio. meu irmão mais velho.
Mas o sonho da Márcinha não se apagou dentro do coração deles e nove meses depois, minha mãe estava grávida outra vez. Só que dessa vez ela disse que não sofreu nada, que ficou belíssima, e que tudo correu muito bem. No dia primeiro de agosto ela almoçou um quilo de filé minhon em forma de rosbife mal passado, sangrando. Meu pai, que ia almoçar em casa estranhou, pois ela não era chegada a mal passados. Ele voltou pra trabalhar, mas já desconfiado pois já estava na hora de eu nascer. Depois que meu pai saiu, minha mãe começou a sentir as dores, a bolsa estourou e as quatro horas e quarenta minutos eu nasci. Leonina com ascendente em aquário e a lua em sagitário. Eles, radiantes, comemoraram muito o meu nascimento. Minha vida sempre teve essa conotação de festa a maior parte do tempo, pois eu sempre fui a alegria da minha casa e sempre me senti muito amada por todos que eu conhecia. Eu digo aparente, porque depois dos meus seis anos de idade eu comecei a dar problemas, e problemas que só quem me amava de verdade pode suportar.
E minha mãe suportou. Tres anos de tratamento psiquiátrico, por causa de terror noturno.
Depois acharam que era algo espiritual e ela começou a fazer trabalhos de umbanda e candomblé e foram mais ou menos 17 anos de sofrimento, pois o terror noturno foi encarado como vidência e mediunidade. Mas apesar disso tudo minha mãe não permitiu que eu não tivesse uma vida normal. Quando iamos a algum lugar onde ficavam muito impressionados com as coisas que eu dizia, impressionados com as coisas que eu descrevia que via, ela não voltava mais lá, e me dizia que eles(OS PAIS DE SANTO E MÃES DE SANTO) que não tivessem visto a mesma coisa que eu não ia poder me ajudar. Nós nos afastava-mos e ela me fazia ter uma vida o mais normal possível. Fiz o colégio, o segundo grau e a faculdade de comunicação social, com especialização em Jornalismo e Editorações nas Faculdades Integradas Estácio de Sá. E em tudo passei com louvor, apesar das interrupções que ocorriam de tempos em tempos. Mas isso não me impediu de fazer parte do grupo de dança do colégio Pedro II - Unidade São Cristovão com a professora Diana Magalhães. Com esse grupo de dança montamos vários espetáculos entre eles posso destacar Epopéia Negra, Epopéia Nordestina e as comemorações do natal da rede globo, onde nós participávamos da festa da chegada de Papai Noel no Maracanã.
Logo que ela começou a me ver crescer ela percebeu que eu tinha tendência a engordar e me entusiasmou a usar cinturitas, modeladores, cintas, simpatia pra fazer cinturinha de pilão, e dieta, porque ela como sempre foi muito elegante, sempre com corpinho de manequim, não me queria com problemas na adolescência e na mocidade, por isso desde os nove anos ela começou a modelar o meu corpo. E sem nenhuma modéstia digo hoje que ela teve muito sucesso. Sempre tive um corpo belíssimo e sempre foi motivo de orgulho, tanto pra mim quanto pra ela.
Eu desde que nasci era chamada de sua boneca e ela brincou muito com essa bonequinha aqui, enfeitou de todas as formas e maneiras e por isso eu sempre andei bem vestida e na ultima moda. Poucas vezes repetia roupa, ela fazia novas pra mim toda semana. Eu era sua modelo viva, tudo que ela fazia pra mim, caia como uma luva, ficava perfeito. O fato de eu ter nascido grande e de ter puxado toda ao lado do meu pai, me fez perder a infância muito cedo, sempre grandona , mas com pouca idade. Isso provocou fatos hilariantes com minha mãe, eu e meu irmão mais velho. O trocador do ônibus, por exemplo, queria que eu pagasse passagem e ela dizia que não ia pagar porque eu não tinha mais de cinco anos, e se ele insistisse, ela xingava até a decima geração do cara. Ela defendia todo mundo que tivesse razão mesmo que ela não conhecesse a pessoa, se metia no assunto e acabava xingando e brigando com todo mundo. Uma vez nós estavamos comprando tecidos numa loja e o vendedor não entendia o que ela estava falando, ai eu disse pra ela um dos nossos códigos:"- Mãe G.B.O". Gente ela teve uma crise de riso, mas ela ria tanto, que o vendedor ficou sem graça, eu já tava ficando com vergonha e ela não parava de rir. Querem saber por que? porque G.B.O significa grende , bobo e otário e foi a primeira vez que ela tinha me ouvido usar essa expressão. Tudo ela podia, tudo ela fazia, nada pra ela era impossível. Ela é a minha MULHER MARAVILHA: FORTE , PODEROSA, INTELIGENTE E SENSITIVA(percebia tudo o que estava acontecendo de longe e sempre sabia o que fazer pra resolver os problemas).
E a sintonia que existe entre nós? Chega a ser invejável a amizade entre nos duas, aos olhos de outras mães. Ela , como sempre muito prosa, não se cansa de dizer o quanto eu sou perfeita, e ela é, eu não sou não, mas sempre prezei nossa amizade. Ela sempre me disse que eramos amigas e que seriamos sempre; mas, se um dia ela percebesse que eu a havia traído eu perderia a amiga e só teria a mãe. E esse sempre foi um dos meus maiores medos, pois eu sei que ninguém seria melhor amiga pra minha mãe do que eu. Mas ela me respeita e tem coisas que ela não quer saber, por isso não pergunta e eu não comento. Assim ninguém se mágoa. Mas mesmo eu sabendo que ela não gosta de alguns assuntos, mesmo assim , as vezes eu toco em alguns pontos e ela responde, mas como eu sei que incomodam, eu os evito. E por causa dessa verdadeira integração espiritual, as vezes eu chego, ela está comentando sobre um certo assunto com alguém e me faz uma pergunta. Imediatamente eu já sei o que fazer e como me comportar. Depois do ocorrido nós rimos muito juntas e reafirmamos nossa cumplicidade.
Depois que eu me formei, não tive sorte pra trabalhar na profissão. Fiz vários estágios, mas nenhum deles se converteu em emprego fixo. Passei um ano em casa, entregando corriculun de lá pra cá e cuidando da nossa mais nova aquisição: Meus pais adotaram um bebe e o Rodrigo passou a ser a razão da minha vida. Mas só cuidar do Rodrigo, estava me deixando muito triste. Eu queria trabalhar, ganhar meu próprio dinheiro, e isso não estava acontecendo.
Minha mãe, havia já alguns anos, tinha montado um salão de beleza e sempre fui eu que fazia a contabilidade do salão, e para me manter mais animada ela disse que ia me contratar, e que até que acontecesse de alguém me chamar eu iria trabalhar com ela. E assim, para o nosso maior conforto ela montou no salão, uma casa pra gente. O Rodrigo ganhou uma cama, uma tv, um vidio game, ela montou uma cozinha completa na parte de traz do salão, com fogão, geladeira, mesa e armário onde ela fazia comida pra gente fresquinha todos os dias. Até meu pai passou a ir almoçar no salão de tão bom que era. Além disso tudo ela ainda ganhava dinheiro, tinha oito funcionarias, produzia o próprio shampo, creme, condicionador e creme de massagem, sua especialização era cabelos das negras e naquela época isso era muito difícil, nós nos sentíamos a vontade, e sentir nossos cabelos com brilho, bem tratados e principalmente lisos e balançando era uma revolução e isso foi sensacional. Ela foi muito bem sucedida como empresária. Foram mais de 20 anos de INSTITUTO DE BELEZA SHEIMAR LTDA. Ela é uma excelente profissional e sabe exatamente o que fazer com cabelo de negras. Ensinou muita coisa pra muita gente, pois ela é do tipo de profissional que segue o conceito de que seu cabelo tem que estar sempre bem, até o momento em que você ao salão. Então, para que as clientes não fizessem besteiras, ela ensinava tudo o que podia e o que não se podia fazer. Treinou todas as funcionárias que trabalharam com ela. Fez delas profissionais. Muitas delas, hoje, tem seus próprios salões e sustentam suas familias com o que ela ensinou. O salão acabou quando uma serie de traições e roubos, foram acontecendo. Ela foi traía pela melhor amiga, que ela tinha colocado pra trabalhar com pra poder ajuda-la, pois ela estava com problemas com o marido. Essa mulher roubou, traiu, enganou, mentiu, atuou como uma atriz que mereceria um oscar, foi falsa, uma verdadeira cobra. Igual a ela, pra vocês terem uma idéia, o que me vem a cabeça é o relacionamento da Irene com a Flora na A Favorita. Quando ela descobriu tudo que vinha sendo feito a anos, entrou em depressão. E para se libertar aquela mágoa contava tudo pra toda cliente que entrava no salão. Diminuiu o numero de funcionárias e cada uma que ia saindo ia levando um pouco das clientes consigo e antes de ter que falir, eu sai, fui trabalhar em outro lugar e ela fechou a firma, alugou uma casa e foi trabalhar nela. Sempre forte e determinada, sem se deixar abater, luta todos os dias por todos nós. Nesse meio tempo perdemos o papai. Isso quase nos derrotou e tudo por causa do senhor FERNANDO COLLOR DE MELO, que roubou o dinheiro que ele tinha economizado por 42 anos para a sua aposentadoria. Dois anos depois dele definhar, o coração resolveu que não queria mais e resolveu parar. Infarto do miocárdio. É duro até hoje, mas ela reagiu e nos fez reagir e reconstruiu a familia. Mas até hoje, quando ela fala do seu casamento ela diz que não se casou, ganhou na loteria sozinha.
Depois que papai morreu e o salão fechou, nossa vida financeira se modificou muito. Eu trabalhava como vendedora de moveis e passei a ajuda-la a sustentar a casa. Mas como eu não tinha e não tenho até hoje, nenhuma experiência em gerenciar uma casa, eu tomei uma decisão: Ensinei a ela a fazer tudo com relação ao banco, dei a ela meu cartão e ela tomava todas as atitudes: Recebia meu pagamento, pagava as contas, fazia as compras, dizia o que era e o que não era possível fazer. Minhas amigas costumavam dizer que eu a explorava e eu respondia:"- Gente ela gosta". E é verdade! Ela gosta de dinheiro. Como gosta. Manuseia, pega empréstimos, paga, faz compras que agente não acredita que vai conseguir pagar e quando vê já terminou de pagar e ainda faz o impossível: Arruma dinheiro pra eu sair e me divertir. Essa é a minha mãe? Não essa é minha melhor amiga. Minha mãe aparece agora. Sabe aquelas horas em que você acha que nada mais tem solução e que você está rodeada de pessoas que amam você e que você vai poder contar com elas nesse momento difícil? Essa hora chegou na minha vida e eu vi que não tinha ninguém, só a minha MÃE.
Nesse momento vi que não lhe dava o devido valor. Não valia á pena amar as outras pessoas, que só vale apena amar quando ele é incondicional e verdadeiro. Eu deveria fazer coisas pela minha mãe, mas essas coisas é ela que faz por mim. Tive uma enfermidade, fiz quatro cirurgias na coluna e na segunda vez passei 67 dias no hospital por conta de uma infecção hospitalar. Por causa dela tive que fazer a terceira cirurgia, tive que colocar uma bomba na ferida cirúrgica que passei 21 dias com ela, fiz 4 buscas de veia profunda, tive agua no pulmão, o coração cresceu, tive um calo nas coronárias e por fim peguei um vírus diferente que me fez começar mais 14 dias de antibióticos. Estou contando isso pra vocês para mostrar o quão forte é essa mulher. Ela não me deixou só, nem um dia se quer no hospital, me visitava todos os dias, com chuva ou com sol ela estava lá. Só ela. Mais ninguém.
Depois eu ainda fiz outra cirurgia na cervical e hoje me encontro em restabelecimento, mas não consigo fazer nada com os braços. Então hoje minha mãe que já foi minhas pernas, hoje é tudo: Braços, pernas, cabeça e coração. A ela eu dedico todo o meu amor, minha fidelidade e principalmente o meu muito obrigado.